quarta-feira, 11 de setembro de 2013

Reportagem do Portal Uai_Mineiros de Ouro



Tirando o livro do pedestal
Gabriella Pacheco 
Foto: Euler Junior/EM/D.A Press 


Quebrar paradigmas. Essa era a intenção de Marcos Túlio Damascena quando propôs ao pai, em 2002, abrir uma biblioteca em um canto da borracharia da família. “As pessoas sempre ligam bibliotecas com lugares limpos e silenciosos, mas eu penso diferente. Acho que o livro cabe em qualquer lugar e tinha como desejo tirá-lo desse pedestal em que o colocaram”, afirma o então borracheiro e hoje professor. Foi assim que ele criou a Borrachalioteca, em Sabará, região metropolitana de Belo Horizonte. 

O acervo, que hoje tem mais de 10 mil exemplares espalhados em quatro unidades, começou com apenas 70 exemplares, entre enciclopédias e livros de literatura, parte deles vindos de doações e parte do acervo pessoal dele. É desnecessário dizer que a iniciativa foi abraçada rapidamente pelos vizinhos e, tão logo, pela cidade. 

Quem sabe tenha sido a descontração do local a responsável por atrair tantos visitantes. Mesmo antes da abertura da biblioteca, Marcos conta que a leitura já fazia parte da borracharia, com a presença constante de vizinhos lendo jornais e revistas em meio aos pneus e a graxa. A rotina o inspirou. 

Apaixonado por livros, ele acredita que a leitura tem um poder transformador e deseja ajudar outras pessoas também a se inspirarem por esse mundo quase mágico. “Eu achava que só os livros poderiam mudar minha vida. Eles nos dão alento. Nosso grande diferencial é apostar nesse poder”, ressalta. 

De fato, o amor pela literatura mudou o caminho dele e fez do borracheiro, um professor. Depois de terem ficado sabendo da iniciativa dele, uma faculdade resolveu patrocinar o curso superior de Marcos, que escolheu – obviamente – o curso de Letras. O diploma veio em 2009 e com ele novas ideias de como influenciar os moradores da cidade. 

Com a ajuda de doações e parcerias, ele abriu mais três unidades do Instituto Cultural Aníbal Machado (nome 'oficial' da Borrachalioeta): a Casa das Artes, a Sala Son Salvador e o Espaço Libertação pela Leitura. Esse último foi aberto dentro do presídio de Sabará, onde Marcos chegou a trabalhar como professor de português. “Foi uma experiência muito marcante. O pessoal ficava ansioso para a aprender e logo, tanto na escola quanto na biblioteca, os detentos estavam absorvendo outro tipo de cultura e gastando mais tempo com livros. Alguns chegaram a passar na Borrachalioteca para me agradecer depois que saíram da prisão. Acho que esse é o poder transformador da leitura”, conta. 

Além da literatura convencional, Marcos também é um entusiasta da literatura de cordel e tenta incentivar os jovens de hoje a conhecerem mais sobre a arte literária. “A Cordeoteca é nossa menina dos olhos. Temos poucas bibliotecas de cordel no país e essa é uma das poucas. Temos três mil exemplares e estamos tentado realizar oficinas para colocar o cordel novamente em pauta”, afirma. 

Mais que fornecer espaços de leitura, o professor tem tentado estimular seu público a produzir e viver cultura também. No grupo Arautos da Poesia, jovens entre cinco e 17 anos, têm sido estimulados a navegar pelo mundo dos poemas, recitando e escrevendo. 

Com uma relação tão próxima com pneus, Marcos também achou um jeito de reutilizá-los na biblioteca. Ele começou oficinas ensinando pessoas a fazerem artesanato com os objetos. A cesta de pneus que carrega livros em atividades externas é um exemplo disso. Uma das propostas para o próximo ano é ampliar o ensino do ecodesign e criar uma cooperativa para que os pneus possam gerar renda para moradores carentes. Outra proposta para o próximo ano é levar espaços de leitura para outros presídios da Grande BH. 

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